Quando as condições de trabalho e salarias dos trabalhadores tornam-se insustentáveis, num país de tamanhas desigualdades sócio-econômicas como o nosso, não resta outra coisa a fazer que não o uso do legítimo direito de greve assegurado na Constituição Federal, mantendo-se, nos chamados serviços essenciais, percentuais mínimos de empregados exigidos para o atendimento da população, e cuidando-se para que o movimento não extrapole os limites do embate trabalhista cívico/constitucional para um confronto sem regras e sem o devido respeito para com o conjunto da população que, na sua grande maioria, depende da normalidade desses serviços.
De nossa parte, apoiamos o movimento dos trabalhadores e suas justas reivindicações salariais, ao tempo em que esperamos que as autoridades públicas e os empresários do setor – sempre tão ávidos pelo lucro acima de tudo -, se esforcem sinceramente para apresentarem uma proposta que seja capaz de atender minimamente aquilo que está sendo pedido e que o no prazo o mais breve seja restituída a normalidade nos transportes públicos em nossa cidade, pondo-se fim ao sofrimento de milhões de pessoas que diariamente dependem do serviço para cumprirem suas obrigações laborais.
Entretanto, e pela experiência que ao longo da vida acumulamos, causa espanto o nível de adesão ao movimento e, por outro lado, o “silêncio complacente” dos empresários, comportamento que não é novo, em matéria de estratégia de busca “compartilhada” de aumento do valor das passagens e de manutenção de seus lucros.
Esta é, sem dúvida, uma questão das mais delicadas, qual seja, se saber quais são, na verdade, os verdadeiros interesses que estão em jogo, no meio de uma greve tão forte como esta, pois, se como já afirmamos, é justa a postura dos trabalhadores pelo atendimento da recomposição de seus salários e de melhores condições de trabalho, nem sempre é dado ao conhecimento público o real nível dos chamados custos operacionais das empresas, considerando-se suas margens de lucro, o interesse público da atividade e uma efetiva e forte atuação do estado em prol do bem comum, no que respeita, por exemplo, à política de subsídios.
O fato é que, a população que precisa desse serviço para cumprir suas obrigações do dia-a-dia, é quem sempre paga esta conta, enfrentando, como agora, e quando consegue, o metrô hiperlotado, recorrendo ao “transporte pirata”, e neste momento plenamente permitido pelas autoridades que antes o aboliu, e muitos, mas muitos mesmos faltando ao trabalho e tendo os dias de falta descontados. São os sem-sindicato e sem-representação de qualquer espécie; sem respeito...
Daí a importância de buscarmos instituir de vez o debate da cidadania e da educação política como instrumento mesmo de emancipação e de aquisição de representatividade política para aqueles que não têm um sindicato forte, não dispõem de uma associação corporativa que preocupe com seus interesses, e para muitos, trabalhadores ou mesmo pequenos empresários e empreendedores, cujos proveitos nada e nem ninguém há para lhes representar. É a constatação da ausência de perspectiva de defesa do interesse comum, ou daqueles direitos que pertencem a todos, mas que por força de outros interesses fortes e quase sempre legitimamente organizados e, também pela ausência de uma participação política no exato sentido do ideal republicano, ou seja, da coisa pública, ficam renegados ao sofrimento, ao descaso, como se nem cidadãos fossem.
E para descobrirmos o que de fato há por trás de justos movimentos como a greve que ora abrange Brasília, além, é claro, das legítimas reivindicações dos trabalhadores, somente um firme investimento no desenvolvimento da cidadania como um todo, de modo que os interesses de um grupo, ainda que justos, não possam ser manipulados para o atendimento e a manutenção dos lucros de empresários, cujas relações com o poder, são há muito orientadas pela pouca transparência e pelo conluio. E mais: que, a menos que tratemos de uma greve geral, cuja decisão tenha sido objeto de ampla vontade das diversas camadas de trabalhadores, por meio, por exemplo de seus sindicatos e centrais sindicais, o resto da população deva ter seu sofrimento amenizado.
Para isso, amigos e amigas, o remédio chama-se educação política, que gera no passo seguinte cidadania, e que permite um grau mínimo de percepção da noção recíproca de responsabilidades e direitos que cabe a cada um de nós, independentemente da força das corporações e do viés de manipulação que se esconde nesse submundo...
Um comentário:
Pegou na veia, Chico, sua abordagem neste assunto. O problema é a falta de enfrentamento e de condições para isso.
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